O embargo chinês à carne brasileira, que já dura seis semanas, tem contribuído fortemente para a queda do preço do boi gordo.
Desde o início de setembro, quando surgiu a confirmação de dois casos atípicos da doença “mal da vaca louca”, um em Mato Grosso e outro em Minas Gerais, a cotação do boi gordo caiu cerca de 15%.
Desde 4 de setembro que o Ministério da Agricultura deixou de emitir a certificação para exportação de carne bovina para a China.
Na ocasião, o mercado acreditava em um breve retorno dos embarques, pois se tratava de casos atípicos, que não oferecem riscos à saúde. Porém, não foi isso que aconteceu.
O problema é que desse período até hoje as indústrias não paralisaram totalmente a produção.
Conforme Lygia Pimentel, CEO da consultoria Agrifatto, os frigoríficos seguiram com a produção para a China com a ideia de manter “a roda girando”.
Para ela, os participantes do mercado tinham em mente o histórico de 2019, quando a suspensão durou apenas 13 dias, e a dificuldade de se encontrar contêineres podem ter pesado na decisão.
“As empresas continuaram produzindo para não perder a oportunidade de venda e o booking do navio. Justamente por essa dificuldade [de contêineres], essas empresas embarcaram cerca de US$ 600 milhões para a China [após a suspensão] sem ter certeza de que as cargas seriam recebidas”, disse Lygia em entrevista concedida ao Valor Econômico.
No dia 19 (terça-feira), o Ministério da Agricultura publicou um ofício suspendendo a produção para o país asiático e autorizando, pelo período de 60 dias, que os fabricantes habilitados a exportar para a China realizassem a estocagem de produtos bovinos congelados, fabricados anteriormente à suspensão.
Na nota, o Ministério disse que não houve nenhuma nova orientação aos frigoríficos e que o ofício apenas atendeu ao pedido formalizado pelo setor produtivo para estocar os cortes produzidos antes de 4 de setembro.
Nesta quinta-feira (21/10), o ministro das Relações Exteriores do Brasil, Carlos França, conversou com o ministro dos Negócios Estrangeiros da China, Wang Yi, sobre a retomada das importações de carne bovina brasileira pelo país asiático.
Segundo informou o Itamaraty no Twitter, os ministros “conversaram sobre abertura e diversificação de mercados, incluindo retomada das exportações de carne bovina brasileira”.
Para alguns especialistas, essa demora na retirada do veto pela China se configura como uma estratégia do país para barganhar por preços menores, visto o contexto de preços elevados.
“O risco sanitário não é motivo real para esse veto, assim como não foi naquela época. É, antes de mais nada, uma questão de barganha. A carne está cara no mundo todo. Eles querem negociar”, disse Tulio Cariello, diretor de conteúdo e pesquisa do Conselho Empresarial Brasil-China (CEBC), à CNN.
Por outro lado, esse imbróglio pode ser positivo para os frigoríficos, ao menos no curto prazo.
Para Lygia Pimentel “O preço do boi caiu mais do que o da carne no atacado Com isso, a margem doméstica melhorou para a indústria. Agora [com a decisão do governo], o frigorífico consegue tirar o ‘prêmio China’ das negociações e consegue pagar menos pelo animal”.
Porém, no longo prazo, a manutenção da interrupção chinesa poderá atrapalhar o planejamento de pecuaristas e frigoríficos.
Os números de confinamento estão caindo desde o embargo de 4 de setembro. Caso a suspensão se mantenha por mais tempo, pode ocorrer do fornecimento de carne declinar mais ainda, o que levará a disparada dos preços no começo de 2022.
Diante disso, podemos dizer que a bola está nos pés da China e o futuro da cotação do boi gordo dependerá da decisão sobre a suspensão ou manutenção do embargo.
Tales é Doutor em Economia pela UFRGS. Realiza pesquisas sobre economia institucional, macroeconomia, mercado financeiro, economia brasileira e desenvolvimento econômico, além de trabalhar com cursos de educação financeira.