A partir dessa terça-feira (7), El Salvador conta com o Bitcoin como moeda oficial do país. Ao lado do dólar americano, o criptoativo inicia seu curso na modesta economia – PIB de US$ 27,02 bilhões, ou 139,7 bilhões de reais – como uma aposta que extrapola as fronteiras nacionais ao atrair a atenção (e a torcida, seja ela positiva ou negativa) de todo o planeta.
Veio direto do jovem presidente Nayib Bukele (40), entusiasta das criptomoedas, a ideia que se transformou em projeto concreto. Mesmo com muita resistência, seus bons números de aprovação popular se somaram à maioria governista no parlamento para que a decisão histórica fosse aprovada.
O governo comprou as primeiras 400 Bitcoins por cerca de US$ 20 milhões (R$ 103,4 milhões na cotação atual), além de separar US$ 130 milhões para apoiar a operação.
A população fará suas transações e pagamentos por meio da carteira digital Chivo. Para incentivar seu uso, cada usuário que se cadastrasse na plataforma com um número de documento pessoal salvadorenho receberá US$ 30 (0,00064 BTC) em sua conta.
Foram disponibilizados também 200 novos caixas eletrônicos capazes de converter os bitcoins em dólares sem qualquer pagamento de taxa.
O presidente defende que, além da aposta feita no crescimento da criptomoeda por si só, a nova opção poderá poupar até U$ 400 milhões em taxas referentes a transações internacionais, seja no envio ou recebimento de remessas.
Bukele também foi à público algumas vezes para tentar esclarecer questões referentes à Bitcoin, mas as pesquisas indicam que o povo de El Salvador ainda se sente muito distante tanto da compreensão de como funciona efetivamente a moeda digital, quanto da aceitação dessa novidade como um todo.
Isso porque de acordo com pesquisa feita pela Universidade Centro-Americana (UCA), praticamente 90% dos salvadorenhos declararam saber “nada ou pouco” sobre a criptomoeda, enquanto de cada 10 entrevistados, 7 se opuseram à sua adoção.
Muitas outras críticas e receios surgiram de dentro e de fora das fronteiras de El Salvador. Primeiramente, por conta da volatilidade da moeda, que num espaço de dois meses – entre abril e maio – viu seu valor despencar de US$ 64 mil para quase US$ 30 mil.
Além disso, como já era de se esperar, a decisão afastou o país da América Central dos principais órgãos reguladores da economia. Os mais de US$ 1 bilhão em financiamentos esperados para o país via Fundo Monetário Internacional (FMI) estão cada vez mais distantes.
De quebra, existe o temor de que a adoção da criptomoeda possa expor o país à ainda mais problemas referentes ao crime organizado, podendo corroborar com a lavagem de dinheiro e demais subterfúgios capazes de facilitar transações ilícitas.
Em meio à prós e contras, o primeiro dia do Bitcoin em El Salvador não foi necessariamente fácil. Além dos problemas de superlotação dos servidores da Chivo terem tirado a carteira virtual do ar em muitos momentos, o dia foi de queda na cotação do ativo, que abriu na casa dos U$57 mil e desvalorizou em mais de US$ 10 mil ao fechar em US$ 47 mil (com expectativa de mais queda nos primeiros momentos da quarta-feira).
Entretanto, Bukele, que já tinha comprado mais 200 Bitcoins na segunda (6), anunciou via Twitter que o país adquiriu mais 150 moedas durante a baixa deste dia histórico, mas turbulento.
E assim a situação deve seguir. Com pressão de gigantes internacionais, desconfiança popular, sustentação dos ideais por parte do governo e, principalmente, olhares curiosos vindos de todo o mundo.
El Salvador se coloca no mapa ao ousar para tentar acelerar sua historicamente conturbada economia, enquanto o experimento pode ser o tão aguardado divisor de águas para as criptomoedas. Seja no sucesso ou no fracasso, o mercado nunca mais será o mesmo.
Com trabalhos de destaque no meio da comunicação desde o primeiro semestre do curso de jornalismo, Victor se aproximou da cobertura econômica ao redigir e apresentar conteúdos diários sobre o mercado para milhares de ouvintes, espectadores e internautas.