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Campos Neto segue à risca manual e desconsidera desaceleração econômica

Por :
Tales Rabelo Freitas
Atualizado: Dec 17, 2021, 14:41 UTC

Presidente do Banco Central envia sinal de que será implacável com inflação, independentemente para onde tiver que levar a atividade econômica. Entenda o que diz a literatura.

Campos Neto segue à risca manual e desconsidera desaceleração econômica

Em apresentação do Relatório Trimestral de Inflação, o presidente do Banco Central, Roberto Campos Neto, disse ontem (16/12) que a autoridade monetária não vai criar metas para a criação de empregos ou crescimento econômico.

Isso justifica o aperto monetário implacável feito pela instituição desde março deste ano, mesmo sobre o contexto de fraco crescimento e risco de desaceleração da recuperação econômica.

Para Campos Neto o combate inflacionário é pré-requisito para a criação de empregos e o aumento dos investimentos e da produção.

“Eu acho que é sempre importante enfatizar que nós entendemos que a meta de emprego e de suavização de ciclos está muito relacionada com a meta de inflação para um país como o Brasil”, afirmou. 

Dessa forma, de acordo com a autoridade principal do BC, é preciso criar um choque recessivo para colocar a inflação no lugar e, no longo prazo, permitir a economia retomar o seu lugar.

“Os exemplos brasileiros mostram que você tem que colocar o país em recessão para recuperar a credibilidade”, afirmou Campos Neto.

Caso queira saber mais sobre o que o Banco Central tem levado em conta nas decisões sobre sua política de juros, fiz uma análise do Relatório Trimestral de Inflação, que pode ser lido neste link.

O que diz a literatura econômica?

Roberto Campos Neto é reconhecido por ser um economista mainstream, seguidor dos manuais ortodoxos da ciência. 

Como bom economista tradicional que é, tem aplicado sem ressalvas o receituário fornecido pela literatura monetarista e novo-clássica.

Esse grupo de economistas acredita que a inflação é um fenômeno essencial monetário, isto é, que a taxa de inflação é proporcional à taxa de variação da quantidade de moeda da economia. 

Por isso, sugerem que a inflação deve ser eliminada por intermédio da redução da taxa de crescimento do estoque monetário. 

Contudo, uma redução da taxa de expansão da quantidade de moeda resulta em aumento da taxa de desemprego.

Portanto, o dilema enfrentado pelas autoridades monetárias é que quanto maior a contração monetária, visando a uma redução drástica da inflação, maior será o desemprego.

Caso as autoridades desejem combater a inflação com menores custos sociais, terão que reduzir a inflação gradualmente, porém, não é este o intuito de Campos Neto.

O papel as expectativas

A partir da análise de seus discursos, é possível inferir que o presidente do BC quer resolver o problema inflacionário o quanto antes e restaurar a credibilidade da instituição de uma vez por todas.

A literatura afirma que a credibilidade é uma importante ferramenta de política monetária. Se a política implementada não for crível pelos agentes, o mercado irá manter suas expectativas de inflação alta e continuar elevando os preços como forma de antecipar o futuro previsto.

Portanto, Campos Neto tem defendido que é preciso pressionar os juros para criar um ajuste recessivo, em que o aumento do desemprego é um custo necessário para aumentar a credibilidade da instituição e, com isso, diminuir a pressão sobre os preços.

Essa ideia está presente no discurso do presidente do BC, quando admitiu a necessidade de continuar elevando os juros para conter as expectativas.

“Tudo está muito relacionado em um país como o Brasil com herança inflacionária recente. E entendemos que, para assegurar a inflação no centro da meta, é muito bom avançar nesse processo de normalização e passar a mensagem de que vamos seguir a meta. O processo vai se estender até quando as expectativas fiquem ancoradas”, afirmou.

Críticas ao modelo

Um dos pontos de crítica ao modelo ortodoxo é que o arcabouço considera a inflação como um fenômeno exclusivamente derivado de fatores de demanda.

Porém, no cenário atual, vários economistas no mundo todo têm afirmado que a inflação resultante da crise da pandemia vem de problemas ocasionados por desequilíbrios de oferta. 

Inclusive os Bancos Centrais das principais economias têm considerado isso na formulação de suas políticas.

Dessa forma, ao aumentar os juros, o BC brasileiro pouco contribui para diminuir a inflação, pois a queda da demanda em nada interfere no ajuste dos preços, que têm sido realizados devido ao aumento dos custos de produção.

Outra crítica à condução atual da política monetária do Brasil é que o ajuste recessivo somente faz sentido quando a taxa de desemprego se encontra desalinhada da sua “taxa natural”, o que não é o caso atual.

A taxa natural é uma taxa que considera apenas o desemprego friccional (quando uma pessoa está em processo de mudança de emprego) e o desemprego voluntário (quando alguém opta por ficar desempregado).

Portanto, fica o questionamento: com uma taxa de desemprego de 13,2%, será coerente dizer que o desemprego atual está abaixo de sua “taxa natural”?

Sobre o Autor

Tales é Doutor em Economia pela UFRGS. Realiza pesquisas sobre economia institucional, macroeconomia, mercado financeiro, economia brasileira e desenvolvimento econômico, além de trabalhar com cursos de educação financeira.

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